terça-feira, 18 de maio de 2010

Alergia a alimento é mais rara do que parece



IRENE RUBERTI

Colaboração para a Folha

Na busca por um culpado para explicar indisposições digestivas recorrentes ou incômodos na pele, tornou-se comum atribuir o problema a algum tipo de alergia alimentar.

Mas as reações indesejadas a comida são menos comuns do que se pensa. "Poucos casos são confirmados depois de feita a avaliação alérgica", diz a médica Ariana Campos Yang, coordenadora do Ambulatório de Alergia Alimentar do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Uma das razões para explicar a "paranoia" com a alergia alimentar é que muitas vezes se confunde a doença com intolerância ou intoxicação, porque os sintomas são parecidos.

A médica do HC conta que recebe muitos idosos que se queixam de coceira na pele e, por conta própria, tiram alimentos da dieta atrás do vilão que causa o incômodo.

"Mas a coceira é provocada pela pele seca, comum em idosos, e um hidratante acaba resolvendo todas as "alergias alimentares" de que se queixam."

Embora muitas pessoas acreditem sofrer de alergia alimentar sem de fato ter o problema, casos reais demoram a ser diagnosticados porque os pacientes relutam em procurar o médico.

"O paciente vai retirando alimentos da dieta e se automedica com antialérgicos", diz Yang.

Para o vice-presidente da Asbai (Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia), Fabio Morato Castro, os casos de alergia estão aumentando. "Há mais pessoas com o problema e com alergia a novos alimentos, como frutas tropicais."

A explicação para o fenômeno não está definida, mas pode estar ligada a novos hábitos alimentares e ao uso de remédios.

As crianças têm mais alergia, principalmente ao leite e ao ovo. Entre adultos, os crustáceos são os que mais provocam reações, ao lado do trigo, da soja e do amendoim. Em muitos casos, a rejeição ao alimento desaparece na fase adulta.

Há um mês, o menino Gabriel, de 2 anos e 5 meses, começou a se coçar enquanto comia macarronada. Ele estava com o rosto, as mãos e os braços lambuzados de molho.

A mãe, a blogueira Thelma Torrecilha, limpou-o e notou que a pele estava vermelha onde havia molho. Uma semana depois, a comprovação: ao comer uma rodela de tomate com as mãos a vermelhidão voltou.

Ele comia tomate desde os seis meses, mas foi pelo contato com a pele que ficou alérgico.

"Ele gosta muito de tomate, então, agora, ninguém mais come aqui em casa", diz Thelma.

No caso de Gabriel, a tendência é que o problema suma com o tempo. Mas o inverso também ocorre: quem nunca apresentou problemas com um alimento começa a ter reações.

Falhas nos diagnósticos são comuns




Não há consenso na definição de alergia alimentar, muitos diagnósticos são falhos e os resultados dos testes têm interpretações diferentes, diz artigo do "Journal of the American Medical Association".
Segundo o alergista e imunologista da Universidade da Califórnia Marc Riedl, um dos autores do estudo publicado, 8% das crianças e menos de 5% dos adultos têm alergia alimentar, apesar de 30% da população acreditar que tem o problema.
Os autores do trabalho, encomendado pelo governo americano, avaliaram todos os artigos médicos que encontraram sobre o assunto, publicados entre janeiro de 1988 e setembro do ano passado.
Os pesquisadores concluíram que há muito material sobre o assunto, mas são poucos os estudos de alta qualidade, feitos com uma boa base de dados e testes rigorosos.
Segundo o artigo, os testes usados atualmente para identificar alergias alimentares não são totalmente confiáveis, o que pode levar, muitas vezes, a diagnósticos enganosos.
O vice-presidente da Asbai (Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia), Fabio Morato Castro, não concorda com o estudo. "Os testes feitos com técnicas adequadas são fundamentais e ajudam no diagnóstico", afirma o especialista.
O levantamento faz parte de um projeto organizado pelo National Institute of Allergy and Infectious Diseases, que pretende estabelecer novos critérios para o correto diagnóstico de alergias alimentares.
A primeira versão do trabalho, preparado por um comitê de especialistas, deve sair até o fim do mês que vem.